quinta-feira, 11 de março de 2010

Ligações republicanas do Sr. Armando Lopes Simões



Rúben (9.º B) - Boa Tarde. Obrigado por ter acedido ao nosso pedido. Como se chama e em que ano nasceu?
Sr. Armando - Chamo-me Armando Lopes Simões. Nasci em 1919, no Rio de Janeiro e em 1923 vim com os meus pais viver para Vale de Açores, no domicílio do Dr. José Lopes de Oliveira, que era meu tio.
Rúben – Onde frequentou a escola primária?
Sr. Armando – Estudei na Escola Primária de Vale de Açores e depois em Mortágua, depois de ser expulso de lá.
Rúben – Então, o que aconteceu para ser expulso?
Sr. Armando – Quando entrei na escola, disse à professora que tinha de passar logo para a 2.ª classe, porque eu sabia tudo da 1.ª classe. Mais tarde, quando andava na 4.ª classe, aconteceu que um dos alunos se dirigiu a mim perguntando-me se as contas dele estavam bem. Ao que eu respondi que as mostrasse à professora, porque não era eu o professor. Como ela estava a dormitar, abanando a cabeça, o aluno considerou que tinha as contas correctas e disse-me que ela tinha dito isso mesmo. Então eu retorqui: - "Como é que ela disse que estão bem, se ela está a dormir?". Ela ouviu, não gostou da minha insolência e arremessou-me a “palmatória”. Eu agarrei nela, arremassei-a e ao bater no quadro, partiu-o. Antes que a professora me castigasse fugi da escola e corri para casa. Pouco tempo depois, meus pais foram notificados que eu estava expulso. Isto aconteceu em Janeiro de 1930.
Rúben – Daí o Sr. Armando ter de frequentar a escola primária em Mortágua. Foi fácil entrar na escola da vila?
Sr. Armando – Não. O meu tio, o Dr. José Lopes de Oliveira teve que solicitar autorização ao Inspector Escolar, Dr. César Anjo, de Viseu. E uma das condições para poder frequentar a escola de Mortágua era residir na mesma localidade.
Assim, terminei a instrução primária na Escola Conde Ferreira, em 1930. Fiquei a viver na casa do professor Tomás da Fonseca, em Mortágua, que era amigo do meu tio, Dr. José Lopes de Oliveira. (Eram cunhados, estavam casados com duas irmãs gémeas).
Recordo ainda que, quando realizei o exame da 4.ª classe, o Dr. César Anjo, que vinha fazer os exames, perguntou-me as linhas de caminho de ferro e eu enumerei-as todas e descrevi os locais por onde elas passavam e as suas respectivas paragens.
Não pude continuar a estudar, porque para se fazer o exame de admissão para prosseguir estudos, tinha de ir para Coimbra, não só a distância na época era grande, como também as despesas não eram fáceis de suportar.
Rúben – Após esse período, a que se dedicou?
Sr. Armando – Em 1940 fui para a tropa para Lisboa. Nessa época, não se podia sair da tropa sem ter pelo menos a 3.ª classe. Depois fui para os Açores, para a Ilha de S. Miguel. Nessa altura cerca de 95% da população não sabia ler nem escrever. Então fundei uma escola para os militares aprenderem a ler, escrever e contar.
Há uma ditado que diz o seguinte: ”Não há nada melhor para aprender do que ensinando”. Não há dúvida que a ensinar os outros enriquecemos os nossos conhecimentos.
Rúben – Como já descreveu um pouco do seu passado, pode agora relatar-nos alguns conhecimentos que tenha do papel de alguns mortaguenses que tenham seguido os ideais republicanos?
Sr. Armando - Conheci o Martins de Abreu. Era conhecido pelo "Catorze de Pinheiro". Contactei de mais perto com o Sr. Augusto Simões, que tinha vindo também do Brasil. Pertenceu ao Directório dos republicanos de Mortágua. Teve sempre presente as linhas condutoras dos princípios republicanos e tinha consciência de que era importante instruir a população, daí ter edificado uma escola em Vale de Açores. Também mandou calcetar as ruas principais de Vale de Açores - como ele dizia, "era preciso retirar o esterco” das ruas -, fez um plano de saneamento, obrigando as pessoas a construir as fossas. Houve algumas que não aceitaram cordialmente esta atitude, no início, pois há sempre uma certa relutância às mudanças.
O Sr. Augusto Simões era maçónico. Um dia, avistei-o todo vestido de encarnado, junto a um diospireiro. Eu observava curiosamente a sua indumentária e ele perguntou-me: “Estás a olhar para os diospiros?” Eu respondi-lhe: “Não, eu nem gosto de diospiros. Estou a olhar para o Senhor, que está muito bonito!”.
Rúben – Muito obrigado pelas suas fantásticas memórias!

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