domingo, 6 de junho de 2010

Manuel Ferreira Martins e Abreu - O "Cavador panfletário"



As comemorações do Dia do Município de Mortágua (13 de Maio de 2010), associando-se ao Centenário da República, evocaram a  acção política e social de seis republicanos mortaguenses com a inauguração da Exposição "Sentir a Terra – Mortágua Republicana”. Durante a Sessão Solene procedeu-se ao lançamento do livro “Os Combates do Cidadão Manuel Ferreira Martins e Abreu", uma edição da Câmara Municipal e da autoria do Prof. Doutor Joaquim Romero Magalhães, que fez a apresentação da obra.
Dados biográficos
Professor, Administrador do Concelho, Escritor e político (1861-1944).
Manuel Ferreira Martins e Abreu nasceu na localidade de Pinheiro, freguesia da Marmeleira, a 15 de Dezembro de 1861. Fez a instrução primária na Marmeleira com o professor Francisco Nunes Cordeiro. Com 11 anos vai para o Porto como aprendiz de uma drogaria. Passou por várias casas do Porto até aos 15 anos. Já adquira o vício da leitura e concebera ambições literárias: se “eu pudesse assimilar aquele estilo, aqueles assuntos variados, profundos, úteis? Tornar-me-ia um sábio, ensinar os ignorantes, castigar os maus (…)” (Inéditos, citado por Joaquim R. Magalhães, ob. cit., p.14).
Em 1881 fez exames em Coimbra do Magistério Primário, obtendo a melhor classificação. “Sem ter recebido favores nem se valer de fraudes – que denuncia.” (ob. cit., p. 15). Pede ao presidente da Câmara de Mortágua para o prover num lugar de mestre-escola, mas nunca lhe foi dado esse lugar por causa das suas convicções políticas.
Em 1884 emigrou para o Brasil para S. Carlos do Pinhal. Neste país foi guarda-livros, administrador de fazendas de café, proprietário de um armazém de materiais de construção e feroz opositor da escravatura dos negros.
Além disso, exerceu, recorrendo a um livro manuscrito por si (o qual esteve exposto na Exposição “Sentir a Terra – Mortágua Republicana”), o professorado em 1885, na localidade de São Carlos do Pinhal, Estado de São Paulo. Publicou artigos no jornal brasileiro Oitavo Distrito.
Em 1888 regressou a Portugal. O seu regresso deveu-se à sua actuação na campanha abolicionista, pois só no Estado de São Paulo havia um milhão de escravos registados como propriedade, que se vendiam, trocavam e até se matavam. Esteve no Porto durante a revolta do 31 de Janeiro de 1891, primeira tentativa de implantação da República, onde terá sido ferido e preso. Não havendo provas da sua culpabilidade, foi libertado quando ia a caminho do Conselho de Guerra, a bordo da corveta “ Sagres” estacionada no Douro.
A sua estada em Portugal fê-lo envolver na política local chegando a ser eleito vereador municipal independente em 1893, recusando-se a conotar-se com qualquer dos partidos monárquicos (Regenerador e Progressista). Como homem revoltado contra as injustiças e a favor dos pobres e desprotegidos, era um revolucionário e panfletário inconformado com a mentira, hipocrisia e prepotência do meio social e político em que vivia, combatendo por uma sociedade mais justa e mais perfeita. As suas ideias e intervenções na vida pública local faziam dele uma figura polémica e incómoda ao status quo, ao ponto de ter feito anular uma eleição local e obrigar a uma nova votação.
Emigrou novamente para o Brasil em 1894, instalando-se na cidade de Cravinhos (Estado de S. Paulo), tendo publicado artigos no Commercio de S. Paulo, “sempre agressivos para o grupo dominante, como seria de esperar.” (ob. cit., pp.27-28).
De regresso do Brasil, em 1903, instala-se na sua terra, na “casita rodeada d’árvores num alto”, a Casa Cimeira e dedica-se ao trabalho nas suas terras. “Labuta no campo durante o dia, leitura e escrita de noite.” (ob. cit., p.29).
Junta-se aos republicanos de Mortágua: Augusto Simões, Albano Lobo, Tomás da Fonseca, Lopes de Oliveira. A sua persistente militância cívica leva o Partido Republicano Português a escolhê-lo para Administrador do Concelho de Mortágua, em 1911. Mortágua era tida como a terra mais republicana da Beira Alta. Faz uma coisa notável, diz Romero de Magalhães – andou pelas freguesias do concelho a fazer propaganda da República, a implementar a obrigatoriedade do Registo Civil. Na tomada de posse do cargo de Administrador do Concelho limitou-se a dizer: “A minha república não é de foguetes, música, vivas ou discursos. Precisamos de obras. Esperai as minhas.” (ob. cit., p.39).
Colabora no Sol Nascente, jornal do Partido Democrático na Marmeleira, dirigido por Basílio Lopes Pereira e Alfredo Fernandes Martins. Esteve ligado à Escola Livre da Irmânia, também na Marmeleira.
No livro Os Combates do Cidadão Manuel Ferreira Martins e Abreu, o Professor Romero de Magalhães sintetiza os principais aspectos da acção cívica deste mortaguense: a luta contra as injustiças; a luta contra o analfabetismo; a promoção da educação, inclusive feminina; a necessidade de discutir as coisas públicas;a  denúncia dos abusos e da corrupção, o combate ao caciquismo; a valorização do trabalho e do cumprimento do serviço público.
Manuel Ferreira Martins e Abreu deixou publicadas as seguintes obras:
- Coisas de Mortágua no ultimo quartel do século XIX offerecido aos homens de Mortágua e ao velho luctador Francisco Cascão. Este folheto dá-se de graça a quem o pedir. Coimbra: Typographia Operaria, 1890.
- Provas das Coisas de Mortágua. Catas a um amigo por Manoel Ferreira Martins e Abreu. Offerecido aos burros de Mortágua para que se façam homens. Editado em Bussaco e Marmeleira de Mortágua por José Joaquim Ferreira Réus – Editor, 1891.
- Política de Campanário e Justiça d`Aldêa (em Mortágua).1893.
- Ajuste de Contas (em Mortágua). S./ l., s. / e., Junho de1894.
Pela Civilização do Brasil. Cravinhos (Estado de S. Paulo), Maio de 1903.
- O meu voto nas próximas eleições. Porto: Typ. A vapor da Empreza Litteraria e typographica, 1906.
- A República da Beira Alta. Porto: Depositária Livraria Chardron, 1913.
- Istoria Contemporânea de Mortágua. Porto: Tipografia Progresso, 1921.
Além destas obras literárias, Martins e Abreu deixou ainda um grande volume de Inéditos que nos relatam acontecimentos e peripécias da sua vida como  Lavrador, Professor, Administrador de Fazendas, Escritor, Jornalista, Autarca e Político. Como lhe chamou Tomás da Fonseca - Um cavador panfletário!
Fontes:
AA VV (2001). Contributos para a Monografia do Concelho de Mortágua. Mortágua: Edição da ADICES e Câmara Municipal de Mortágua.
MAGALHÃES, Joaquim Romero (2010). Os Combates do Cidadão Manuel Ferreira Martins e Abreu. Mortágua: Edição do Município de Mortágua.
http://www.cm-mortagua.pt/modules.php?name=Sections&sop=viewarticle&artid=66

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